A Camil, maior empresa de processamento e distribuição de arroz do Brasil, dobrou de tamanho com a aquisição de uma de suas concorrentes, a uruguaia Saman, com a qual espera fortalecer sua posição nos mercados interno e externo. Concluída no fim de 2007, a compra da empresa uruguaia por cerca de US$ 160 milhões transformou a Camil no maior grupo industrial de processamento de arroz da América do Sul, com um faturamento que deverá ultrapassar US$ 1 bilhão em 2008, 50% mais que em 2007. A compra da Saman abriu as portas do mercado internacional para a Camil, no exato momento em que o arroz atinge o maior preço de sua história, sendo negociado por US$ 1 mil a tonelada. Com isso, a contribuição das exportações para o faturamento do grupo poderá passar de 6% para 35%, ou o equivalente a US$ 325 milhões. Juntas, Camil e Saman formam um conglomerado capaz de processar 1,3 milhão de toneladas de arroz, em 13 unidades industriais - cinco no Brasil e oito no Uruguai -, com 1.475 funcionários. Quando a Camil assumiu o controle da Saman, a cotação do arroz no mercado internacional estava começando a superar o patamar de US$ 400 a tonelada. Em entrevista ao Valor na sede da Saman, na zona portuária da capital uruguaia, o diretor-executivo Renato Soares Gastaud enumerou a entrada de novos clientes na carteira da Camil. Através da unidade uruguaia, o arroz da Camil, que hoje é despachado para 11 países nas Américas e na África, chegará aos maiores mercados consumidores da Ásia (Filipinas, Malásia), do Oriente Médio (Irã e Iraque), além da União Européia, já a maior cliente da Saman. A Saman exporta 95% de sua produção de cerca de 600 mil toneladas. Mas a Camil não olhou só para as exportações quando comprou a Saman. A empresa uruguaia era também fornecedora da Camil e concorrente em algumas áreas do Nordeste brasileiro. Com 14% de participação no mercado brasileiro, a Camil queria reforçar sua posição com os 50 produtos que distribui em todo o país. Gastaud afirma que a Saman vai voltar ao mercado brasileiro, que absorvia 80% de suas exportações há cerca de quatro anos e atualmente abocanha apenas 35%. "A volta será mais ordenada porque será via Camil, que conhece melhor o mercado brasileiro, que tem uma presença maior e uma estrutura de distribuição muito forte", diz ele. Para Gastaud, a compra da Saman significou para a Camil uma maior sinergia. Ao mesmo tempo em que não se sobrepõe à Camil no mercado brasileiro, a Saman traz para o grupo gaúcho "uma nova visão exportadora" que a Camil não conseguia alavancar por causa da "estrutura de custos no Brasil", incluindo portos, fretes e a carga tributária - na qual Uruguai e Argentina levam reconhecida vantagem em comparação ao Brasil. "As razões que levaram a Camil a comprar a Saman se confirmaram e a alta dos preços facilita o retorno do investimento. Até nossa relação com os produtores melhorou", afirmou o diretor-executivo da Saman. O executivo se referia às nuvens que pairavam sobre o negócio no Uruguai quando a aquisição veio a público, no ano passado. Houve uma forte resistência, tanto dos produtores quanto da sociedade uruguaia, à "estrangeirização" da maior e mais importante indústria do agronegócio deste pequeno país. Havia um temor, em especial, de que a Camil desarticulasse o chamado "preço-convênio", um sistema de formação de preços para o arroz que vigora há cinco décadas. Por este sistema, o preço ao produtor para a safra de um ano é definido em uma reunião anual entre os produtores e as indústrias que representam 80% do processamento, e calculado com base na média dos valores praticados na safra anterior. "É um sistema transparente, em que há um só preço para todos os produtores, independentemente se é um proprietário ou um arrendatário, de sua escala de produção, da distância em que está sua fazenda ou se está ou não capitalizado", defende Tabaré Aguerre, presidente da Associação dos Cultivadores de Arroz (ACA) do Uruguai. "Aprendemos como funciona o preço-convênio e vamos mantê-lo. No Brasil não funcionaria, mas no Uruguai funciona bem", garantiu Gastaud.