Praticamente na mesma sintonia de milho e soja desde o fim de 2006, o trigo se descolou em maio e encerrou o mês com a mais expressiva queda de preços no mercado internacional entre as oito principais commodities agrícolas negociadas pelo Brasil no exterior, segundo cálculos do Valor Data baseados nas médias mensais dos contratos futuros de segunda posição de entrega (normalmente os de maior liquidez) transacionados nas bolsas de Chicago e Nova York. Pressionada sobretudo por sinais de recuperação da oferta no Hemisfério Norte, onde a colheita começa a ganhar fôlego em junho, a cotação média do trigo caiu 11,69% em Chicago em maio em relação a abril. Com o tombo, talvez amenizado pelas incertezas que cercam as exportações argentinas, o cereal deixou de acumular a maior valorização nos últimos doze meses entre as commodities pesquisadas - uma constante ao longo de quase todo o ano passado -, mas a alta ainda chega a 58,67%. Em relação à máxima histórica de 12 de março passado, o preço de sexta-feira foi quase 40% menor. Em abril, quando todo o universo pesquisado perdeu sustentação, a maior baixa em relação às médias março já havia sido a do trigo (18,49%). "Houve um descolamento, e com isso as relações entre as cotações de soja, trigo e milho ficaram mais próximas de seu comportamento histórico. Nos últimos meses o trigo quase superou a soja em Chicago, o que não é normal", diz Élcio Bento, analista da Safras & Mercado. Bento ressalva que a relação entre estoques finais e consumo globais continua muito baixa, o que reforça nele a crença de que há pouco espaço para novas retrações expressivas e que "o mercado encontrou um novo patamar de equilíbrio". Mas isso se as perspectivas de recuperação no Hemisfério Norte de fato se concretizarem, e isso depende, entre outros fatores, do clima na Austrália, onde a agricultura vem sendo prejudicada há anos por estiagens recorrentes. Como não poderia deixar de ser, milho e soja também sofrem a influência do andamento das safras do Hemisfério Norte, principalmente a americana, mas em maio voltaram a "colar" no petróleo. Este esteve bastante volátil no mês passado, mas continuou estabelecendo novas máximas e carregando os grãos por sua influência nos preços dos biocombustíveis - etanol e biodiesel. Daí porque o preço médio do milho, matéria-prima para a produção de etanol nos Estados Unidos, subiu 0,49% em Chicago na comparação entre maio e abril. Isso apesar dos baixos estoques globais do grão, cuja redução de mais de 10 milhões de toneladas na temporada 2008/09 foi confirmada pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) no início do mês. Incertezas climáticas americanas também colaboraram para oferecer suporte, mas o "nome do jogo" em maio foi petróleo. "As atenções em Chicago estiveram concentradas no milho. E isso também favoreceu, por tabela, o fortalecimento da ligação entre a soja e o petróleo", observa Renato Sayeg, da Tetras Corretora. Pelo critério dos preços médios, o grão subiu 0,57% em Chicago em maio, mesmo com aumentos na produção de Brasil e Argentina, a expectativa de considerável elevação na colheita americana e, com essa conjunção, os sinais concretos de recuperação nos estoques mundiais. Sayeg nota que o vínculo entre o grão e o petróleo não se fortaleceu só por causa do milho. O USDA sinalizou uma maior utilização de óleo de soja para a produção de biodiesel no mercado americano, o que impulsionou as cotações do óleo de soja em Chicago, também com desdobramentos "altistas". "O mercado não esperava", diz Sayeg. Conforme ele, no caso da soja o efeito das restrições argentinas às exportações teve peso relevante. Em Nova York, onde as "soft" commodities ainda se ressentem mais do aumento da participação de fundos de investimentos até pouco tempo atrás alheios ao mundo agrícola, o algodão caiu 1,14%, também sob a influência da safra americana, e o cacau subiu 3,15%, "dirigido" também pelo desenvolvimento das safras intermediárias africanas. Para açúcar, café e suco de laranja, também negociados em Nova York, o que se passou no Brasil esteve na mira dos traders no mês passado. Na relação dos preços médios mensais, o açúcar recuou 4,27% em maio. "O mercado absorveu que existe pressão de oferta no curto prazo, alimentada por estoques elevados, inclusive no Brasil, o que é incomum", diz Julio Maria Martins Borges, da Job Economia e Planejamento. No médio prazo, acredita Borges, a tendência é de valorização, uma vez que a nova safra brasileira de cana será mais alcooleira e as pouco atraentes cotações do açúcar em 2007 desestimularam a produção em outros países, inclusive a Índia. No café, o resultado da "disputa" entre especulação e fundamentos - nesta frente a safra brasileira concentrou atenções - foi uma discreta valorização de 0,46% em Nova York em maio, enquanto no suco de laranja o choque entre essas mesmas forças provocou queda de 2,15% em relação ao preço médio verificado em abril pelo Valor Data. E o suco segue como a única das oito commodities pesquisadas a registrar baixa nos últimos doze meses até maio. Maurício Mendes, presidente da consultoria AgraFNP, expõe que, apenas pelo que apontam os fundamentos, não há muito espaço para recuperação no curto prazo. A produção americana de laranja continua em recuperação, os estoques estão maiores depois que o consumo naquele país arrefeceu após a disparada de preços entre 2004 e 2006 e mesmo no Brasil os sinais são de ampliação da oferta.