Registro - Estudo prevê alterações radicais na agricultura brasileira se houver aquecimento global
Data:
11/08/2008
O aquecimento global poderá modificar a tal ponto as condições do clima brasileiro que, em vez de plantar soja e milho, os campos gaúchos poderão ser ocupados, daqui a algumas décadas, por cana-de-açúcar e café. Dois cenários para o aumento da temperatura por conta do efeito estufa foram traçados por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) no estudo Aquecimento Global e Cenários Futuros da Agricultura Brasileira, que será divulgado hoje. Na melhor hipótese, até 2100 o acréscimo seria de 1,4°C a 3,8°C. Na pior, de 2°C a 5,4°C. Se essas elevações das temperaturas se confirmarem, percorrer uma estrada gaúcha com campos de milho de um lado e de soja do outro poderá ser mais difícil, segundo o estudo: no Brasil, a área propícia a essas culturas estaria entre as mais afetadas e poderia se reduzir em 41% e 17%, respectivamente, até 2070. — No Rio Grande do Sul, por outro lado, abre-se uma possibilidade real de plantar culturas de clima mais quente como a cana-de-açúcar — diz Hilton Silveira Pinto, da Unicamp, um dos coordenadores da pesquisa. O problema pode estar logo ali: o acréscimo de 3°C na temperatura poderia resultar em perdas de R$ 7,4 bilhões na safra brasileira de grãos já em 2020 — subindo para R$ 14 bilhões em 2070. Isso porque haverá necessidade maior de irrigação e, segundo Pinto, a água terá se tornado uma commodity a ser usada com parcimônia. — A saída está na pesquisa, em adaptar culturas às novas condições — diz. Modificar radicalmente os campos gaúchos é algo altamente improvável. O presidente da Associação Brasileira do Agronegócio no Estado, Antônio Wünsch, garante que a soja nunca deixará de ser plantada, até porque o investimento para modificar as culturas é alto demais. Plantar cana em vez de milho exigiria um novo maquinário e preparo do solo totalmente diferente. — Mesmo com dificuldades, sempre haverá o plantio — afirma Wünsch. Soja e milho respondem por mais da metade dos 25 milhões de grãos que devem ser produzidos no Estado este ano, diz o analista de mercado Argemiro Brum. Além disso, a produção de leite, suínos e aves depende dessas culturas: os animais são alimentados com farelo de soja e milho. Brum também aposta na ciência para impedir que a situação se agrave. Lembra que pesquisas de melhoramento genético já produzem grãos mais resistentes à falta de chuva. — Imaginar hoje que plantaremos cana-de-açúcar (no futuro) é fora de propósito — afirma Brum. Na opinião de Pinto, a principal lição do estudo, conduzido desde 2001, é a necessidade de desenvolver culturas mais tolerantes ao calor e à seca.