Utilizada para fazer tofu - base da dieta chinesa - durante mais de dois milênios, a soja nunca foi tão importante para a China quanto agora. À medida que sua economia cresce, também aumenta o apetite chinês por carnes - bovina, suína e de frango - que exigem uma quantidade maior de soja como subproduto para ração animal. Preocupada com suas reservas de água limitadas - são necessários mil litros para produzir uma tonelada de grãos – a China está voltando seus olhos para o Brasil, em especial, para Mato Grosso, maior produtor brasileiro de soja, oleaginosa rica em proteínas essenciais para uma dieta mais saudável e potencial geradora de produtos derivados para ração, uma receita ideal para os chineses. "Mato Grosso tem o que a China precisa".
Por conta da incapacidade de produzir soja em quantidade suficiente para o seu suprimento interno, devido à escassez de água e de terras agricultáveis, a China - com uma população de 1,4 bilhão de habitantes e crescimento de 7% a 8% ao ano - se lança à busca global por mais produtos agrícolas na América do Sul, onde as terras ainda são baratas e abundantes, caso de Mato Grosso. Segundo levantamento da AgraFNP, os preços da terra destinada à agricultura, no Estado, encerraram 2008 em queda. Na região de Rondonópolis (210 quilômetros ao sul de Cuiabá), que concentra as terras mais caras do Estado (R$ 10,5 mil por hectare), por exemplo, a desvalorização foi de 4,65%.
Por conta de todas estas vantagens, a volúpia chinesa pela soja brasileira não poderia ser outra. O comércio com a China explodiu. O Brasil aumentou suas vendas em mais de 50% e Mato Grosso mais do que dobrou suas exportações em volume físico para os chineses, no primeiro quadrimestre deste ano. O crescimento, comparado ao mesmo período de 2008, foi de 119,45% (1,94 milhão de toneladas, contra 884 mil toneladas), representando 46% das exportações totais de grãos do Estado, que fechou em 4,22 milhões de toneladas. Em valores transacionados, a cifra atinge US$ 686,89 milhões, incremento de 89,83% em relação ao período de janeiro a abril do ano passado (US$ 361,84 milhões).
Para completar a pauta de exportações do complexo soja (grãos e derivados) à China, Mato Grosso ainda vendeu no período 4,29 mil toneladas de óleo de soja e 1,21 toneladas de glicerina.
"Mato Grosso produz o que a China precisa, que são os alimentos. O que os produtores devem fazer é intensificar este comércio que já está firme e se apresenta bastante promissor", analisa o consultor econômico da Federação das Indústrias no Estado de Mato Grosso (Fiemt), Carlos Vitor Timo Ribeiro.
ALERTA - Os produtores rurais consideram o aumento do apetite chinês bem-vindo, entretanto, temem a crescente influência da China como compradora de soja. As lembranças ainda estão frescas do incidente da "soja vermelha" de 2004, quando a China rejeitou vários carregamentos brasileiros após alegar que estavam contaminados. "Não acreditamos que um novo episódio como este venha a ocorrer, mesmo porque eles dependem da soja e somos a melhor alternativa que eles têm", lembra o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja), Glauber Silveira.
O fundamental neste momento, na avaliação dos analistas, é partir com mais agressividade para o mercado que mais cresce no mundo. "Mato Grosso não faz nenhuma promoção comercial na China, apenas está reagindo a uma demanda por commodities. Se a gente quiser diversificar nossa exportação, temos que partir para uma atuação mais ativa em relação à China", apontam.
Glauber Silveira considera o mercado chinês o mais importante do mundo para Mato Grosso. "A China produz apenas 16 milhões de toneladas de soja – menos do que Mato Grosso produz sozinho - e é dependente de importações para dar conta de alimentar toda sua população. Também somos dependentes do mercado chinês, que compra quase 50% de toda a nossa produção de grãos. Acho que os interesses se completam e abrem um novo horizonte para ambos".
O projeto de expandir as vendas à China, entretanto, esbarra nos efeitos da crise iniciada nos Estados Unidos. "Estamos preocupados com a extensão dessa crise e precisamos saber se ela irá afetar a demanda chinesa, que vinha crescendo 10% ao ano", afirma Silveira. Segundo ele, já existe uma sinalização de que o consumo cairá, "agora estamos mais atentos quanto a um possível impacto no volume das nossas exportações".
Para o presidente da Fiemt, Mauro Mendes, o mercado chinês é altamente promissor. "Mato Grosso é um Estado vocacionado para atender à China, sobretudo por ser um dos principais fornecedores de commodities agrícolas do mundo. As oportunidades são muitas, basta que os empresários saibam reconhecê-las e aproveitá-las", diz.