Câmbio na casa dos R$ 1,70 - com tendências ainda mais baixistas –e estimativas de safra abundante podem prejudicar ainda mais o campo.
A safra 09/10 mal chegou à reta final de plantio, em Mato Grosso, e os produtores já contabilizam prejuízos para a próxima colheita, que começa a partir de janeiro de 2010. Por conta da desvalorização do dólar – acirrada nas últimas semanas -, as perdas na rentabilidade agrícola podem chegar a até 20% para o produtor, de acordo com cálculos da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado (Aprosoja).
Estimativas de perda – sustentadas por estudos e estatísticas - são feitas quase que diariamente pelas entidades de pesquisa. O último levantamento do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), por exemplo, diz que no plantio da safra 08/09 a média de câmbio era de R$ 2,17, enquanto no último mês de outubro a cotação do dólar despencou para R$ 1,74. Neste mês de novembro, contudo, o câmbio já está na casa de R$ 1,70.
A tendência baixista do dólar está deixando os produtores mato-grossenses apreensivos em relação aos preços da safra 09/10. Face à desvalorização da soja nas vendas futuras, os produtores já começam a contabilizar os prejuízos. Como se não bastasse o câmbio, as expectativas de grandes safras para os maiores produtores mundiais – Argentina, Brasil e Estados Unidos – achatam ainda mais os preços ofertados pelo grão, ao produtor, e deixam o cenário para 2010 ainda mais desanimador. Até o momento, os grandes produtores têm perspectivas positivas para produção do grão. Mato Grosso, no topo da cadeia produtiva da soja no país, deverá colher safra recorde, acima de 18 milhões de toneladas. A oferta doméstica já será maior.
Na avaliação dos analistas de mercado, os preços [da commodity] no mercado internacional estão bons, mas não suficientes para compensar a desvalorização do dólar. “Com certeza, vamos ter crise no setor na próxima safra devido à queda de rentabilidade do produtor”, afirma o diretor administrativo da Aprosoja, Carlos Fávaro.
Ele concorda que os preços hoje não são os piores, mas lembra que os custos continuam proibitivos para o produtor. “A margem está ruim e os custos se mantêm em níveis elevados. A questão da logística e os altos preços dos fertilizantes estão eliminando o lucro dos sojicultores”.
Na avaliação dos produtores, os preços este ano atingiram bons níveis devido ao “infortúnio” dos concorrentes. “As circunstâncias negativas dos Estados Unidos e da Argentina nos favoreceram, mas não podemos contar com o azar dos outros para obter resultados. Temos de resolver nossos problemas internos”, apontam.
INSUMOS Carlos Fávaro lembra que os insumos indexados ao dólar, comprados pelo produtor, também ajudam a aumentar as perdas no campo. Segundo ele, em maio, quando o produtor estava comprando os insumos, o dólar girava em torno de R$ 2 a R$ 2,05. Hoje, com a cotação de R$ 1,70, a redução é de 15%”.
“Temos projeção ainda de que o dólar poderá cair para menos de R$ 1,70. Isso significa, de imediato, uma perda de 20% na rentabilidade do produtor, devido ao descasamento entre receita e despesa. Este prejuízo inviabiliza totalmente o setor, principalmente de commodities de exportação como é o caso da soja”, afirma o diretor da Aprosoja.
Fávaro diz que o produtor terá de assumir os prejuízos decorrentes da queda de renda provocada pela desvalorização cambial. “Em abril, o planejamento da safra já estava feito, as variedades escolhidas e os fertilizantes comprados. O produtor não tinha como voltar atrás em sua decisão de plantar”.
Segundo ele, a saída será tentar compensar os prejuízos com o aumento da produtividade, melhor manejo da propriedade e evitar despesas extras desnecessárias. “O produtor terá de controlar bastante o custo interno da propriedade e contar com medidas governamentais de apoio – como prêmios de escoamento do produto - caso o câmbio fique nesses patamares”.
Impacto no frete e sobre preços O movimento de alta ou baixa na cotação do dólar – como o que está ocorrendo nas últimas semanas - tem impacto direto nos custos do frete e na formação dos preços da soja. Segundo a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja), o produtor é o que mais tem sofrido nas últimas safras com a volatilidade do dólar, porque tem dificuldade de repassar o aumento dos custos para o preço do produto. O resultado deste descompasso é a queda, ano a ano, da renda agrícola.
A soja é a commodity mais prejudicada com estas variações. Como aponta o segmento produtor, apesar de todas as altas contabilizadas ao custo de produção, o produtor não faz o preço da saca, a formação do preço é ditada pelo mercado
De acordo com o diretor administrativo da Aprosoja, Carlos Fávaro, o dólar baixo afeta, principalmente, aqueles que estão localizados em regiões mais distantes dos portos de escoamento, como os do Centro-Oeste do país. "O real é a moeda que forma o valor do transporte no Brasil. Quando este custo é convertido para dólar nas baixas cotações, o valor fica mais alto".
Estudos realizados por institutos de pesquisa agropecuário apontam que o produtor gasta hoje 38% da sua renda bruta com frete. Isso significa que para cada 100 sacas de soja que ele transporta, 38 são apenas para pagar frete. “Ainda está caro produzir frente ao alto custo de produção e as incertezas do câmbio”, alerta Fávaro.
Carlos Fávaro diz que o frete fica “mais caro ou mais barato” dependendo da cotação do dólar. Ele faz duas simulações para exemplificar a perda do produtor toda vez que o câmbio sofre redução. “Com o dólar a R$ 2, o produtor vai pagar R$ 7 por saca até ao porto. Com o dólar a R$ 1,70, ele paga R$ 10. O momento exige muita cautela, pois ninguém sabe ao certo o que ainda irá acontecer daqui para frente”.
ESPECULAÇÃO O diretor executivo da Aprosoja, Marcelo Duarte Monteiro, diz que os últimos anos em que o produtor plantou com dólar baixo foram desastrosos. “Todos se recordam que entre as safras de 2004 a 2008, os agricultores plantaram com dólar mais alto e colheram com dólar mais baixo. O resultado foi a crise no setor”, disse.
Fávaro lembra que todas as despesas em reais, como frete, folha de pagamento, reposição de peças, manutenção da frota, impostos e outras, sofrem variações quando há movimento no câmbio.
“Se considerarmos a taxa de R$ 2 no começo do ano e a de R$ 1,70 agora, vamos constatar que a receita do produtor sofreu uma depreciação”. O pior, acrescenta, é que esta volatilidade “segue dentro de um movimento especulativo, em que o governo federal já deveria ter tomado as providências para evitar a entrada de capital externo no Brasil, o que tem ocasionado danos às exportações brasileiras não só as do agronegócio, como todos os setores exportadores”.
MELHORA De acordo com as estatísticas, a safra 08/09 foi a primeira em cinco anos em que o dólar foi maior do que na época do plantio. “A trajetória declinante do dólar preocupa. Acredito que neste momento o produtor tem de estar muito atento e travar contratos que venham a cobrir os custos e gerar uma margem de rentabilidade”, orientam os analistas.